A propósito de Cogumelos


O I Encontro de Micológico da Terra Quente, decorreu, a trinta de Novembro, em Macedo de Cavaleiros, esta actividade fez parte do programa da Feira de Castanha e contou com a participação de alguns entusiastas adeptos, a organização esteve a cargo da Associação Agriarbol e da Câmara Municipal de Macedo de Cavaleiros. Do programa constavam, da parte da manhã, uma saída de campo com recolha e identificação de cogumelos, almoço ao ar livre e, da parte da tarde, realização de um colóquio com a presença de especialistas: o Eng.º Pedro Capela, o Prof. Dr.º Francisco de Ana-Magán da Universidade de Santiago de Compostela e a Dr.ª Anabela Martins do IPB que versaram, respectivamente, sobre as temáticas de "Recursos Micológicos no Mundo Rural", "Produção de Cogumelos nos Soutos" e a "Importância dos Cogumelos na Natureza". Fascínio pelos cogumelos
Recentemente, perguntei a um amigo verdadeiramente aficcionado, de onde lhe vinha o gosto pela apanha e pela confecção culinária dos cogumelos - respondeu-me prontamente que era hereditário, que desde miúdo se lembrava de andar montes fora, à cata de cogumelos. Adorava também o seus sabores, e enumerava, para minha surpresa, os diversos pratos que podem ser confeccionados com os cogumelos, os diversos métodos de conservação, mas, percebia-se pela maneira com falava, que parte dessa paixão era pelo andarilhar pelas matas, dia inteiro, o desafio de os descortinar- com o olhar de lince já treinado- simulados entre a folhagem dos castanheiros e dos pinheiros. Experimentada esta subtil caça, fica-se adepto, assegurou.
Sabemo-los comestíveis, sem valor culinário, venenosos ou alucinógenos (os chamados cogumelos mágicos) e outros com importantes aplicações no campo da bioquímica, mas todos fascinantes e misteriosos. As formas fálicas que alguns ostentam reforçam ainda mais os mistérios que os cercam.
Identificação dos cogumelos
Os especialistas aconselham a utilização de bons manuais que se encontram no mercado com facilidade ou frequência de cursos específicos a cargo de associações e universidades, mas de um modo geral e sem pretensões, é importante observar as características do chapéu: cor, forma, textura do chapéu e a existência de lâminas de baixo do chapéu ou de poros (como uma esponja) e as características do pé: a cor, forma, textura do pé, se tem ou não volva, uma espécie de saco em que está inserido o pé. O cheiro dos cogumelos é também um importante facto de identificação, assim como o local onde surgem. Mas, segundo um micologista, "Todos os cogumelos são comestíveis, mas alguns, só uma vez..." Os cogumelos mais apreciados em Portugal são- agora é para fazerem boa figura- os frades ou rocas (Macrolepiota procera), as sanchas ou pinheiras (Lactarius deliciosus), os míscaros (Tricholoma equestre) e os tortulhos ou boleto (Boletus edulis). Mais invulgares, mas muito referenciados pelo elevado valor gastronómico são os Cantharellus cibarius e a Amanita cesarea.
Papel na floresta
Convém recordar que os cogumelos constituem a parte reprodutiva do fungo, onde se reproduzem os esporos. Lembrava-me também de uma deliciosa descrição destes fungos da autoria da bióloga Rita Serra1 "É como se uma enorme macieira estivesse enterrada debaixo da terra, com inúmeros ramos muito finos, e nós, cá fora, só vemos as maçãs, quando chega a sua época. Mas, a macieira, o micélio está lá todo o ano." Os biólogos salientam também o papel ecológico desempenhado pelos fungos na floresta porque para além de serem "agentes de reciclagem da matéria" estabelecem micorrizas, isto é associações simbióticas com as árvores. As árvores fornecem alimento ao fungo, e este ao estender-se por grandes áreas funciona como amplificação das raízes, recolhe e disponibiliza água e nutrientes para as plantas. Assim, concluiu ainda Rita Serra "Diferentes árvores podem estar ligadas ao mesmo fungo, trocando alimentos entre si, numa espécie de uma enorme internet florestal. As árvores, além de receberem mais nutrientes, são mais resistentes às doenças. Por esse motivo, tem-se recomendado que não se lavrem ou danifiquem os cogumelos nos soutos, pois os castanheiros resistem melhor à doença da tinta, se estiverem micorrizados."
Saída de campo
Os participantes apresentaram-se cedo, ansiosos por percorreram matas na ânsia de se defrontarem com os fungos. Esperava não fazer má figura, sabia que o uso de cesta arejada era obrigatório, de modo a não os danificar durante o transporte e a promover simultaneamente a dispersão dos esporos, assegurando a sua reprodução. Tinha aprendido já a dizer o magnífico " Macrolepiota Procera" na vez dos vernáculos frades ou rocas, respeitava a paixão pelos cogumelos e, pouco a pouco, sentia-me conquistada ao nível da degustação. Foi-nos explicado que não se deve arrancar brutalmente o cogumelo, porque afecta-se o micélio (a estrutura subterrânea). Podem ser colhidos com uma faca, para cortar o pé do cogumelo e não perturbar o micélio, se houver já muita prática na identificação dos mesmos. Se o presença do pé for importante para a identificação da espécie, deve-se retirar cuidadosamente o cogumelo, desprendendo-o do solo e não deixar o micélio exposto, cobrindo-o suavemente com terra ou folhas.
Durante a manhã, perante a alegria de todos, encontraram-se algumas espécies de cogumelos comuns na zona, comestíveis e não comestíveis. A novidade, para mim, foi a língua de vaca , que é como quem diz a Fistulina hepatica. Os cogumelos colhidos, após terem sido identificados, enriqueceram a Mostra de Cogumelos Silvestres patente na Feira de Castanha, em simultâneo com a Mostra de Árvores Comuns na Terra Quente.
Colóquio
Durante o colóquio foram equacionados diversos aspectos associados aos cogumelos, o primeiro orador, o Eng Pedro Capela, salientou a importância de legislar o sector da comercialização dos cogumelos silvestres, legislação que implicaria: a regulamentação da colheita; restrição da mesma em zonas sensíveis, a garantia de mais valias económicas para a região e, por ultimo, o estabelecimento de normas para a recepção, transformação e comercialização de cogumelos. Enquanto o ouvia defender estas posições, lembrava -me de ter ouvido, recentemente, que várias pessoas apanham o cogumelo indiscriminadamente, sem cuidados que assegurem a sua continuidade. Por outro lado, a apanha premeia sobretudo os diversos intermediários, muitos estrangeiros. Pedro Capela referiu que "os valores gerados por venda directa correspondem de 10 a 20 % do valor real transaccionado". Salientou a importância da educação ambiental e das normas éticas de conduta orientadoras da colheita divulgadas nos diversos manuais temáticos, das quais destaco, por exemplo: procurar que a colheita dos cogumelos seja o menos prejudicial possível, para não destruir a sua estrutura subterrânea denominada de micélio; evitar apanhar nas áreas protegidas; não recolher cogumelos muito jovens, demasiado velhos ou deteriorados; não destruir nunca as espécies desconhecidas, nem as que saibamos ser venenosas - Na teia, imperceptível aos nossos olhos, que une as diversas espécies na natureza, todos os seres contribuem para um valioso equilíbrio. O Dr.º Francisco Ana-Magán , entre outros assuntos focados, estabeleceu várias relações entre a produtividade dos cogumelos e os seguintes factores associados aos soutos: espaço entre as árvores, o movimento do solo, a idade da planta, a limpeza do mato, a utilização de adubos e o procedimento na apanha. Sublinhou, com base em investigação efectuada nos castanheiros micorrizados em viveiro, as suas vantagens relativamente ao acréscimo na absorção de fósforo e na disponibilidade de água. Assim, a planta dispõe de mais nutrientes e melhora substancialmente.
A Dr.ª Anabela Martins centrou a sua comunicação no papel determinante dos cogumelos na reciclagem dos materiais na floresta e na relação simbiótica que alguns cogumelos estabelecem com as árvores. Partilhou com a plateia as particularidades biológicos do cogumelos- estabelecendo que um único fungo poderia ocupar uma área de 15 hectares, pesar 10 000 kg, após ter vivido tranquilos 1500 ano. É obra!
Apontou como factores condicionantes da produção de cogumelos a luz, isto é , o espaçamento entre as copas das árvores, a alternância de períodos de luz e de escuridão e a conjugação da temperatura com a humidade ambiental. Divulgou também algumas conclusões decorrentes do trabalho de investigação no terreno, que tem vindo a desenvolver no IPB acerca desta temática.
Um recurso a potenciar
" Os lucros obtidos com os cogumelos silvestres, chegam, por vezes, a ser superiores ao da própria madeira. " Ana-Magan F., et al 2000
Das três intervenções salientaram-se alguns denominadores comuns: a elevada rentabilidade económica dos cogumelos, cuja apanha pode tornar-se uma produção complementar à castanha e à madeira; a importância de converter o cogumelo numa valia para a região, agente de desenvolvimento rural sustentável, cujo valor e potencialidades económicas, gastronómicas, turísticas e outras, têm vindo a ser descuradas pela comunidade local e aproveitadas por outros; a pertinência em divulgar informação, conhecimento técnico e a identificação das espécies junto da comunidade. E também a importância em salvaguardar e promover quer as boas práticas na colheita dos cogumelos, quer as práticas agrícolas que não põem em causa a continuidade da actividade da colheita dos cogumelos, de modo a tirar partido das relações ecológicas e simbióticas que estes estabelecem com várias arvores das florestas e em particular com os soutos.
Sabores à maneira
Para aproveitar o valor vitamínico dos cogumelos, o jantar, que foi muito bem servido, teve como base inspiradora o cogumelo. Á sopa de Pleurotus Ostreatus - as repolgas- , seguiu-se a carne estufada também com repolgas e as várias sobremesas típicas da região, tais como: pudim de ovos, pudim de castanha. Uma inesperada e excelente tarde de Agaricus, os champignos encerrou deliciosamente o repasto.
As conversas que animaram o jantar inspiraram-se também nas curiosidades e saberes em torno dos cogumelos. Menos que recém iniciada neste mundo deslumbrante, adormeci, com uma pequena ansiedade: será que amanhã é um bom dia para apanhar cogumelos? Bibliografia Consultada:
Serra Rita, Revista do Parque Biológico, nº5, 2002, pags 16-19
Garnweidner Edmund , Cogumelos, Mundo Verde, Everest Editora
Fernández de Ana-Magan, J.f., Fernández, R. António (2000)
"Os cogumelos nos ecossistemas florestais galegos"- Edições xerais da Galicia S.A. Eugénia Gonçalo


Sabemo-los comestíveis, sem valor culinário, venenosos ou alucinógenos (os chamados cogumelos mágicos) e outros com importantes aplicações no campo da bioquímica, mas todos fascinantes e misteriosos. As formas fálicas que alguns ostentam reforçam ainda mais os mistérios que os cercam.
Identificação dos cogumelos
Os especialistas aconselham a utilização de bons manuais que se encontram no mercado com facilidade ou frequência de cursos específicos a cargo de associações e universidades, mas de um modo geral e sem pretensões, é importante observar as características do chapéu: cor, forma, textura do chapéu e a existência de lâminas de baixo do chapéu ou de poros (como uma esponja) e as características do pé: a cor, forma, textura do pé, se tem ou não volva, uma espécie de saco em que está inserido o pé. O cheiro dos cogumelos é também um importante facto de identificação, assim como o local onde surgem. Mas, segundo um micologista, "Todos os cogumelos são comestíveis, mas alguns, só uma vez..." Os cogumelos mais apreciados em Portugal são- agora é para fazerem boa figura- os frades ou rocas (Macrolepiota procera), as sanchas ou pinheiras (Lactarius deliciosus), os míscaros (Tricholoma equestre) e os tortulhos ou boleto (Boletus edulis). Mais invulgares, mas muito referenciados pelo elevado valor gastronómico são os Cantharellus cibarius e a Amanita cesarea.
Papel na floresta
Convém recordar que os cogumelos constituem a parte reprodutiva do fungo, onde se reproduzem os esporos. Lembrava-me também de uma deliciosa descrição destes fungos da autoria da bióloga Rita Serra1 "É como se uma enorme macieira estivesse enterrada debaixo da terra, com inúmeros ramos muito finos, e nós, cá fora, só vemos as maçãs, quando chega a sua época. Mas, a macieira, o micélio está lá todo o ano." Os biólogos salientam também o papel ecológico desempenhado pelos fungos na floresta porque para além de serem "agentes de reciclagem da matéria" estabelecem micorrizas, isto é associações simbióticas com as árvores. As árvores fornecem alimento ao fungo, e este ao estender-se por grandes áreas funciona como amplificação das raízes, recolhe e disponibiliza água e nutrientes para as plantas. Assim, concluiu ainda Rita Serra "Diferentes árvores podem estar ligadas ao mesmo fungo, trocando alimentos entre si, numa espécie de uma enorme internet florestal. As árvores, além de receberem mais nutrientes, são mais resistentes às doenças. Por esse motivo, tem-se recomendado que não se lavrem ou danifiquem os cogumelos nos soutos, pois os castanheiros resistem melhor à doença da tinta, se estiverem micorrizados."
Saída de campo

Durante a manhã, perante a alegria de todos, encontraram-se algumas espécies de cogumelos comuns na zona, comestíveis e não comestíveis. A novidade, para mim, foi a língua de vaca , que é como quem diz a Fistulina hepatica. Os cogumelos colhidos, após terem sido identificados, enriqueceram a Mostra de Cogumelos Silvestres patente na Feira de Castanha, em simultâneo com a Mostra de Árvores Comuns na Terra Quente.
Colóquio


Apontou como factores condicionantes da produção de cogumelos a luz, isto é , o espaçamento entre as copas das árvores, a alternância de períodos de luz e de escuridão e a conjugação da temperatura com a humidade ambiental. Divulgou também algumas conclusões decorrentes do trabalho de investigação no terreno, que tem vindo a desenvolver no IPB acerca desta temática.
Um recurso a potenciar
" Os lucros obtidos com os cogumelos silvestres, chegam, por vezes, a ser superiores ao da própria madeira. " Ana-Magan F., et al 2000

Sabores à maneira

As conversas que animaram o jantar inspiraram-se também nas curiosidades e saberes em torno dos cogumelos. Menos que recém iniciada neste mundo deslumbrante, adormeci, com uma pequena ansiedade: será que amanhã é um bom dia para apanhar cogumelos?
Serra Rita, Revista do Parque Biológico, nº5, 2002, pags 16-19
Garnweidner Edmund , Cogumelos, Mundo Verde, Everest Editora
Fernández de Ana-Magan, J.f., Fernández, R. António (2000)
"Os cogumelos nos ecossistemas florestais galegos"- Edições xerais da Galicia S.A.














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